DESABAFO/ DAQUELES DIAS DE QUERER DESINSTALAR-ME DO PLANETA

Foto por Nandhu Kumar em Pexels.com

Eu não me encaixo.

O mundo segue muito rápido. Eu não alcanço. Não me encaixo. Cansei.

Quase desistindo de tentar acompanhar a tecnologia. Ela está evoluindo mais rápido do que a capacidade humana, diz Friedman. E o mundo sendo remodelado por essas acelerações me assusta no modo power.

Cansada de buscar sinal, rede, de chegar no restaurante e ter que ler menu por QRcode. Não entendo nomenclaturas novas. Eu não me encaixo. Desisto. Só queria ser feliz com pouco. Como antigamente, como no tempo dos meus pais. E nem faz tanto tempo. Entardecer na vida sem perder a conexão com o planeta, com os mais jovens ou mais espertos que eu. Envelhecer com digna idade, sem sentir-me um Tricerátops numa loja de vasos de Murano, sem chamar a atenção para tamanha defasagem.

Cansei de ser mostruário do obsoleto. Ser lembrada a todo momento, ferida, mesmo os outros não tendo a intenção, por causa do meu não alcance dos novos dispositivos eletrônicos e aplicativos “facilitadores”. Tá chato. Não quero me encaixar. Escolho brincar de jogos mais fáceis. Jogar o jogo da velha. A pressão me esmaga, me diminui o tamanho e começo a sentir que sou pouco, fora do tempo, presença antiquada e incômoda aos outros.

Estou entristecendo. Eu, que sempre teimo em ser alegre, sei que estou desbotando. Meu contorno esfumaça. Alma embotada, desmilinguida. ” Que dificuldade!” me diz alguém próximo a mim…” Não consigo entender, é tão simples”. “Burra!” Sigo encolhendo. Já perco a força do saber-me valorosa, interessante, necessária. É assim que sente a pessoa que envelhece? Agora entendo. O rótulo mata. A impaciência alheia , a invisibilidade. Passamos a não fazer falta. Que triste! Pior é a sensação de estar incomodando, aborrecendo quem está nessa engrenagem. Ao mesmo tempo penso: Pobre dos jovens e crianças de hoje! Triste sina. Eu cresci desabotoada, floresci sem pesticida, nem cerca.

É quase tarde para me encaixar nesta engrenagem doida. Desembestada.

Mas sobra a poesia do que ainda resta. Em mim, em alguns respiros intervalados de nossa humanidade. E neste pouco que resta me seguro com alguma esperança de sobrevida. Sobre a vida? Ah, só quero esticar o prazo de felicidade. Mas!

Eu já não me encaixo.

3 comentários em “DESABAFO/ DAQUELES DIAS DE QUERER DESINSTALAR-ME DO PLANETA

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  1. Eu me encaixo, no teu texto.

    Me faz refletir sobre algo que li:
    o que nos faz triste é ‘querer’, desejar. Sim, claro, e ter que lidar com a frustração de não conseguir.

    Nossa geração está aging com esse adicional de perigo, a tecnologia!

    Ainda bem que sobra a poesia e o Friedman para nos validar, rs

    1. Chris, com um comentário como este não preciso de nenhum mais. Brilhante. De fato, mais simples NÃO QUERER. Sempre lembro da minha mãe, tão bem resolvida quanto a ser dona de casa toda a sua vida. Eu tentando analisá-la e ela demistificando toda a baboseira da mulher que não pôde sair de casa porque cuidava da casa e da comida de todos os irmãos mais velhos. Eu triste por ela, imaginando o quão difícil devia ter sido para ela não ter podido completar os estudos. E ela: “minha filha, eu escolhi. Eu adoro ser dona de casa”. Sem vitimização, ao contrário, achando tudo natural e aceitável, aceitando ter sido a caçula que perdeu a mãe aos seis anos e que teve que cuidar da casa para que o pai , irmãs e irmãos pudessem trabalhar. Sem DESEJOS inalcançáveis, sem QUERER ser alguém mais que não uma excelente mãe, esposa e dona de casa. Uma canceriana porreta, projetada para amar. Faz todo o sentido pra mim o teu comentário. Let´s age ! and do poetry.

      1. Tua Mãe é maravilhosa. Uma grande mulher, canceriana raiz, avó de Anjo!
        Deixo um abraço carinhoso para ela.

        No mais, segue o baile! Parando de vez em quando para escrever um interessante e belo texto ou completar umas palavras cruzadas.

        Vc já é fera na internet e nem se deu conta. Besos

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